..era o ano de 1958, ano de ouro para o esporte brasileiro, quando brilhavam atletas não mercenários como Pelé, Garrincha, Maria Ester Bueno, Abílio Couto, Biriba, Cláudio Rosa, Eder Jofre, transmitindo uma sensação de orgulho e empolgação para o povo brasileiro.
Eu, com meus 14 anos, fui até a sala da casa de meus avós, na pequena e ensolarada Bebedouro, e como de hábito liguei o rádio e sintonizei meu programa favorito o “Pick-up do Pica-Pau”, concebido e conduzido pelo inesquecível Walter Silva. Nessa época, eu já era movido à música, nem sei a causa, pois minha família era constituída basicamente por graduados em medicina.
Após ouvir os hits da época, que não me empolgavam muito, interpretados por Cauby, Nelson Gonçalves, Anísio Silva e Dalva de Oliveira, ouço algo totalmente diferente e contagiante. Era um cantor e violonista baiano chamado João Gilberto, interpretando “Chega de Saudade”, composição do nosso grande maestro e compositor de sambas canção Tom Jobim, com letras do poetinha e diplomata Vinicius de Moraes e fiquei extasiado...
Tive esta mesma sensação aos 18 anos, época que estudava no ITA (e ainda não sabia as conseqüências de uma ditadura militar), e... não sei como, apareceu em meu apartamento um livro de “um tal” de Jean Paul Sartre chamado “A idade da razão”. Eu, com ciências exatas encravadas na pele e totalmente avesso aos livros de leitura obrigatória no tempo de ginásio (O Guarani, Iracema...), li, devorei e amei “A idade da razão” e com este impulso misterioso fui “obrigado” a conhecer toda obra de Sartre.
Após ouvir “Chega de Saudade”, apesar de não ser músico, minha vida musical mudou. Queria conhecer mais sobre a bossa nova, sua origem, influências e limites. Foi assim que descobri o jazz, que para mim, com minha ingenuidade interiorana achei que era a bossa nova norte-americana.
Fui atrás... e coincidentemente, no final da década de 50, na pequena e simpática Itapetininga durante aqueles bailinhos de fim de semana, que aconteciam na casa das filhas de pais casamenteiros, eu dançava, sonhava e amava ouvindo “Misty” com Johnny Mathis.
Misty??? Quem foi o gênio que teve a sensibilidade para compor esta música tão empolgante e contagiante? Descobri que foi “um tal” de Erroll Garner (a letra é de Johnny Burke), compositor e pianista de jazz que, tal como Durval Ferreira e Johnny Alf na Bossa Nova, nunca tiveram o devido reconhecimento e valorização pela obra que conceberam. Muitos críticos americanos não consideram Erroll Garner um compositor e pianista de jazz.
“Look at me”... Erroll Garner nasceu em 15/06/21 em Pittsburg e faleceu de câncer no pulmão em 02/01/77 em Los Angeles. Nunca aprendeu a ler música e suas principais influências foram os pianistas Fats Waller, Art Tatum e Earl Hines.
Sua obra prima e considerado um dos melhores álbuns de jazz é “Concert by the sea” (do selo Columbia n.700.801/2-451042), gravado ao vivo em 19/09/55 na cidade de Carmel, Califórnia o que lhe rendeu o título de “Músico do ano” pela conceituada revista de jazz Down Beat em 1958. Erroll Garner estava muito bem acompanhado por Eddie Calhoun no baixo acústico e Denzil Best na bateria, e os melhores momentos do CD ficam para as faixas I'll remember April, Teach me tonight, April in Paris e Where or when. Simplesmente imperdível...
Desde então, fui irremediavelmente contagiado pelo ”vírus do jazz”, e felizmente continuo portador do mesmo até os dias de hoje.
Nenhum comentário:
Postar um comentário